segunda-feira, 22 de junho de 2009

A Importância do Épico

Desde os tempos mais antigos, os povos têm cantado em verso e em prosa seus heróis e suas conquistas utilizando-se de narrativas épicas. Seus modelos de virtude, coragem e determinação sempre foram cantados em versos grandiosos que se perpetuaram através dos tempos até chegar aos nossos dias.

Nas histórias, constituídas de sagas em que mesclam aventuras de reis, soldados, heróis e gente comum, aos poucos cada povo, cada nação, foi deixando marcada a sua passagem pela terra. Muitos desses povos hoje sequer existem mais. Contudo, suas histórias permaneceram e se tornaram eternas.

Assim, o esforço desses primeiros brasileiros que foram os primeiros a ter a audácia e a coragem de escrever épicos baseados em nossa história é de um valor incalculável. Bento Teixeira, Santa Rita Durão, Basílio da Gama, Cláudio Manoel da Costa e Teresa Margarida da Silva e Orta foram os pioneiros na tentativa de dar ao povo brasileiro um lugar entre os imortais da história da humanidade.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Fragmento de "Poema Épico-Trágico"

1

Portentos de valor, e mil proezas
Descreve o Grego, canta o Mantuano;
De seus heróis as cívicas empresas
Digam outros em metro soberano:
Ociosos repitam as finezas
Desse vendado Deus, o amor insano;
Entusiasmado Apolo lhes inspire,
Todo o Parnaso a seu favor conspire.

2

Com rouca voz, e Lira dissonante
Meus males cantarei, que o injusto fado
Contra mim suscitou, com mão possante,
Empenho vil, rigor precipitado:
Da fortuna mortal e inconstante
Darei um exemplar nunca cantado
Pois que de Casa, honra e Liberdade Me usurpou a maior fatalidade.

Fragmento de "Aventuras de Diófanes"

LIVRO I

Sumário


Embarcando os Reis de Tebas, Diófanes, e Climinéia, com seus
filhos Almeno, e Hemirena, que se achava desposada com
Arnesto, Príncipe de Delos, que pela ocasião dos jogos
públicos, a que devia assistir, as esperava na mesma ilha com
prevenidos festejos, para celebrarem as bodas, uma tormenta
desbaratou a esquadra, que acompanhava a Diófanes, e o
entregou aos de Argos seus inimigos, que no combate
mataram a Almeno, e venderam Diófanes para Corinto;
Climinéia, a Hemirena ficaram em Argos, ainda que muito
distantes; e depois de três anos da mais cruel escravidão
venderam Hemirena para Atenas, donde fugiu às estimações, e
grandezas, por não desprezar os preceitos do decoro.
Determinava Diófanes achar-se na Ilha de Delos, para assistir à função dos jogos públicos, que ali se fariam em reverência de Apolo, em cujo Templo se devia contrair o himeneu de Arnesto, Príncipe da mesma Ilha, com a Princesa Hemirena, funções para que haviam concorridos muitos Príncipes Estrangeiros. Embarcou Diófanes, Climinéia sua mulher, e seus dous filhos Almeno, e Hemirena, levando uma esquadra em sua guarda, conforme pedia a decência. Em uma enganosa madrugada se despediram de Tebas, entregando as velas ao benigno Zéfiro, que aos matizados galhardetes animava com alegres movimentos. Soavam os instrumentos no mar ao compasso, em que as vozes repetiam em terra os viva daqueles Soberanos, que em grande extremo eram amados dos vassalos, porque em seus Domínios davam leis a justiça, e a clemência, e o seu exemplo a melhor direção para os costumes; e ainda que se entendia seguiriam o rumo das felicidades, e não seria dilatada a sua ausência, era grande a tristeza de seus vassalos, que só resignados nas vontades daqueles Príncipes queriam mostrar com cânticos, que as lágrimas eram nascidas do júbilo; mas na despedida se declaram filhas da saudade, a qual consolavam com o Príncipe Bireno, a quem os poucos anos dispensava a assistência daqueles jogos.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Aventuras de Diófanes e Poema Épico-Trágico

Teresa Margarida da Silva e Orta escreveu as Aventuras de Diófanes, também chamado de Máximas de Virtude e Formosura, em meados do século XVIII. A publicação desta obra data de 1752 em sua primeira edição. Em 1790 saiu a terceira edição mas, dessa vez, a obra veio sob o nome de Alexandre de Gusmão, um amigo da autora já falecido. Para maiores esclarecimentos a respeito, vale considerar o estudo de Sofia de Melo Araújo, cujos fragmentos abaixo são bastante esclarecedores:

“Muitos são os motivos apontados para que a já quase octogenária Teresa Margarida permitisse que a terceira edição do texto hoje aceite como seu, de 1790, viesse a público em nome do seu amigo íntimo Alexandre de Gusmão, já por então falecido – Maior aceitação de um autor masculino? Estratégia comercial visando o pres­tígio do autor? Co-autoria? Homenagem póstuma dada a partilhada paternidade efetiva dos ideais expostos? Infelizmente, teremos que nos render a que, até à desejada submissão do fio do tempo ao tecer humano, do passado nada mais temos que os textos que os homens de então escolheram (ou puderam) legar-nos. Assim, creio ser esté­ril a discussão de intenções neste ato. Igualmente infrutífera, mais competitiva que científica, me parece a querela entre os defensores de Aventuras de Diófanes como obra brasileira (dada a nacionalidade de Orta), portuguesa (dada a sua vivência quase exclusivamente em Portugal) ou luso-brasileira (numa espécie de terreno misto, assente nas condições políticas do Brasil colônia do século XVIII), discussão alimentada muito em torno da apresentação da própria como ‘estran­geira’.

(...) Mais interessante será, então, creio, a questão de voz autoral, en­quanto realidade múltipla e paleta de distintas intensidades. De fato, e aceitando Teresa Margarida como a mão que delineou as palavras de Aventuras de Diófanes, muitas são as vozes que ecoam no texto: desde logo o já nomeado Alexandre Gusmão, estrangeirado, escrivão de D. João V e peça fundamental no Tratado de Madrid, como documenta Jaime Cortesão, amigo e mentor de Teresa; também, mais ao longe, conseguimos ouvir ecos de Luís António Verney e da sua defesa da importância da educação feminina, embora apenas enquanto meio para o fim de uma melhor cidadania das crianças educadas pelas mu­lheres; o próprio texto reclama a voz de Fénelon no seu Aventures de Télémaque; perpassam o texto as vozes iluminadas de Voltaire, Diderot, Montesquieu, Rousseau...; mas ecoa, sobretudo a voz de uma mulher muito especial que é ela mesma um símbolo emancipado das/pelas Luzes, a própria Teresa Margarida que aos treze anos se apaixona por um homem mais velho e decide tomar as rédeas da sua vida por forma a conduzi-la rumo à felicidade, que aos 16 anos aceita ser de­serdada e foge com o homem que ama, que toda a vida não permite a pai, irmão, marido, filhos, rei ou carcereiro que lhe coloquem grilhões na Alma, no Coração, na Razão ou na Voz.” (ARAÚJO, 2006.)

O Poema Épico-Trágico foi escrito entre 1770 e 1777, época em que a autora esteve presa. A pesquisadora Christina Ramalho afirma que Teresa Margarida

“por certo sequer imaginara estar gerando, em pleno século XVIII, no âmbito da literatura de língua portuguesa, sementes de questões curiosas: a manifestação literária épica, com seus feitos grandiosos e heróis másculos e guerreiros, seria um canto vedado à autoria feminina? Que motivações, que inter-relações e que visão histórica haveriam que surgir para tornar concebível essa autoria? Por que esse canto épico somente no século XX passou a receber a atenção de autoras? Ainda refletindo sobre esses questionamentos, qual fora a ousadia de Teresa Margarida ao fazer uso dessa forma tradicionalmente nobre de criação literária? A resposta nasce de uma observação atenta da referenciação poética explícita desde o início de Poema épico-trágico.

A referência inicial a Homero e Virgílio ratifica tanto a intencionalidade épica de Teresa Margarida quanto sua coerência com as tendências estéticas neoclássicas da época, ainda que, em relação ao plano do conteúdo, a escritora tenha construído um discurso centrado em um “eu” de acentuada natureza pré-romântica. A ousadia, no entanto, fica por conta de esta ter assumido, em primeira pessoa, uma condição heróica que a punha no mesmo patamar de outros “heróis de cívicas empresas”, ou seja, a seu martírio particular, a autora deu relevância mítico-dramática, fazendo uso da mais clássica expressão literária para dar destaque à sua peculiar condição de exilada no Mosteiro de Freiras da Província da Beira, a mando do Marquês de Pombal. A autora, portanto, de forma pioneira, inseriu, através de seu texto, a história privada nos compêndios da tradição épica, cujo objeto de interesse sempre foram, e continuariam sendo, os chamados feitos e fatos grandiosos, todos eles, obviamente, embrionários da força física, coragem e inteligência masculinas. Da terceira estrofe em diante, clarifica-se sua real intenção: chamar a atenção das autoridades reais para a situação inusitada e duradoura: foram sete anos de confinamento em que se encontrava.” (RAMALHO, 200?)

Este Poema Épico-Trágico foi publicado somente em 1993, a partir de um manuscrito pertencente à Biblioteca José e Guita Mindlin.

Teresa Margarida da Silva e Orta

Teresa Margarida da Silva e Orta nasceu em São Paulo no ano de 1711 ou no início de 1712, sendo que não há registros exatos de sua data de nascimento. Em 1716 viajou com a família para Portugal, onde morreu em 1793 em Lisboa.

Seu pai, José Ramos da Silva, tinha chegado ao Brasil em 1695, com pouco mais de doze anos de idade, como criado de servir. Era filho natural de Valério Ramos e de Maria da Silva, lavradores, naturais e residentes na freguesia de São Miguel de Beire, bispado do Porto. Após uma curta permanência na Bahia, onde então ficava a capital da colônia, foi tentar a sorte em São Paulo, onde se casou, em 1704, com Dona Catarina Dorta, brasileira, de sangue mestiço, mas também descendente dos Orta, família tradicional portuguesa. José Ramos da Silva notabilizou-se durante a invasão francesa ao Rio de Janeiro ocorrida em 1710. À época, já era um próspero comerciante, possuidor de uma boa fortuna, a qual foi alcançada, sobretudo, com negócios para as Minas Gerais.

Em 1716, José Ramos da Silva decidiu regressar a Portugal com a família, mantendo através de seus procuradores importantes negócios no Brasil. Na metrópole, ele conseguiu ser feito Familiar do Santo Ofício, tendo recebido o título de Cavaleiro da Ordem de Cristo e arrematado o contrato de dízima da Alfândega do Rio de Janeiro. Em 1722, comprou o cargo de Provedor da Casa da Moeda de Lisboa, um dos cargos mais cobiçados do reino.

A família tinha três filhos: Matias Aires, o mais velho, educado pelos jesuítas no Colégio de Santo Antão; Teresa Margarida e Catarina Josefa, educadas no Convento das Trinas, e destinadas à vida religiosa. Este convento, fundado em 1661, acolhia meninas entre os sete e os vinte e cinco anos de idade. José Ramos da Silva parece ter planejado concentrar toda a riqueza nas mãos do filho varão. A mais nova, Catarina, será freira, não se sabe se por vocação ou adesão, e chegará a abadessa do Convento de Odivelas.

Quanto a Teresa Margarida, outro foi o seu destino. Conhecera, provavelmente durante o tempo em que permaneceu no convento das Trinas, Pedro Jansen Moller, 10 anos mais velho, por quem se apaixonara. Com apenas dezesseis anos ela solicitou dispensa matrimonial ao Patriarcado de Lisboa para poder casar-se sem a autorização paterna.

O pai, José Ramos da Silva, inconformado com a autorização obtida pela filha que se casou a 20 de janeiro de 1728, não aceitou as diligências conciliatórias do jovem casal. Para padrinho do primeiro dos doze filhos de Teresa Margarida, foi convidado o pai; para madrinha do segundo, a mãe Dona Catarina. Nenhum compareceu aos batizados, mas o pai não deixou de assistir ao casal com elevadas quantias de dinheiro, queixando-se, contudo, do genro arrivista e das atitudes da filha.

O marido de Teresa Margarida faleceu em 1753, deixando-a numa delicada situação financeira e com doze filhos para educar. Os processos por ela movidos contra o irmão Matias Aires, para reivindicar a sua parte na fortuna paterna, pois o pai a deserdara, arrastaram-se pelos tribunais durante longos anos. Feriam os interesses do irmão, herdeiro universal, que alegava ter esta recebido em vida do pai somas ultrapassando significativamente o que lhe caberia pela legítima herança.

Teresa Margarida foi presa em 1770, por acobertar os amores de seu filho mais novo, chamado Agostinho, com Teresa Mello, da Casa dos Melo. Teresa Margarida foi presa no mosteiro de Ferreira de Aves, sob ordens do Marquês de Pombal. Agostinho foi degredado para Angola. Quanto a Teresa Melo, esta foi presa num convento, privada dos bens de família e desnaturalizada, isto é, impedida de usar o nome de família.

Somente após a morte de D. José as arbitrariedades cometidas pelo Marquês de Pombal, parente de Teresa Melo, foram remidas por D. Maria I. Em 1777, Teresa Margarida foi posta em liberdade. Dessa data em diante, ela irá viver em Lisboa na companhia de seu cunhado, o monsenhor e inquisidor Joaquim Jansen Moller.

O seu livro, As Aventuras de Diófanes, foi publicado em 1752. O título original era Máximas de virtude e formosura com que Diófanes, Climinéia e Hemirena, príncipes de Tebas, venceram os mais apertados lances da desgraça. Teresa Margarida usou o pseudônimo Dorotéia Engrássia Tavareda Dalmira. Só mais tarde se conheceria o verdadeiro nome da autora, que faleceu em 20 de Outubro de 1793.

Poema Épico-Trágico é o título de outro livro seu, sendo este escrito entre 1770 e 1777, durante o tempo em que Teresa Margarida esteve presa. Neste livro, provavelmente a autora teve a intenção de valorizar a si mesma e a sua história pessoal com o objetivo de obter o perdão do rei. A primeira edição deste livro foi publicada em Portugal em 1990 por iniciativa da Professora Doutora Maria de Santa Cruz. No Brasil, a publicação se deve à pesquisadora Christina Ramalho e data de 1993. Ambas as edições tiveram por base o manuscrito pertencente à Biblioteca José e Guita Mindlin.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Fragmentos de "Villa Rica"

Vila Rica - Canto VI

"Levados de fervor, que o peito encerra Vê os Paulistas, animosa gente,
Que ao Rei procuram o metal luzente
Co as próprias mãos enriquecer o erário.
Arzão é este, é este, o temerário,
Que da Casca os sertões tentou primeiro:
Vê qual despreza o nobre aventureiro,
Os laços e as traições, que lhe prepara
Do cruento gentio a fome avara.
A exemplo de um contempla iguais a todos,
E distintos ao rei por vários modos
Vê os Pires, Camargos e Pedrosos,
Alvarengas, Godóis, Cabrais, Cardosos,
Lemos, Toledos, Paes, Guerras, Furtados,
E os outros, que primeiro assinalados
Se fizeram no arrojo das conquistas,
Ó grandes sempre, ó imortais Paulistas!
Embora vós, ninfas do Tejo, embora
Cante do Lusitano a voz sonora
Os claros feitos do seu grande Gama;
Dos meus Paulistas honrarei a fama.
Eles a fome e sede vão sofrendo,
Rotos e nus os corpos vem trazendo,
Na enfermidade a cura lhes falece,
E a miséria por tudo se conhece."

Vila Rica - Canto VI

"Terifea a ocasião julga oportuna,
Põe os olhos no Céu, alta coluna
Levanta, e firma em terra;
já sobre ela se ergue e murmura e nota cada estrela
Com o dedo, depois desce e riscando
Muitas vezes em roda, vai tocando
A coluna, que treme e que se move:
Tolda-se em sombra o ar, troveja e chove:
E o tronco de entre a nuvem que o cobrira,
Sai figurando um tigre, que respira
Fogo e veneno pelos olhos; passa
Com ele ao monte, e o guia onde a caça
Se tenta e busca; aqui dormia Aurora;
Dormia; e junto aos pés branda e sonora
Fontesinha o repouso convidava;
O peito em grande parte debruçava
Sobre uma penha, e ao gesto brando e lindo
De encosto o mole braço está servindo,
Chega a Maga cruel, põe-lhe diante
A fera, que conduz, e ao mesmo instante
Se oculta em parte, onde o sucesso veja:
O cuidado de a ver, ou fosse a inveja
Aquele sítio encaminhava os passos
Do destemido Argasso; entre embaraços
De mal distintos ramos já descobre
O mosqueado tigre, ao braço nobre
O crê despojo, e de matá-lo espera,
Firme o pé desde longe aponta a fera,
E atrás puxando o braço a seta envia,
Que vai cravar no monstro a ponta fria.
Corre gritando, ó Césa, e vê passado
De Aurora o peito; em vão busca assombrado
O tigre, que não há: já desfalece
A pouco e pouco a bela: a mágoa cresce
No mísero homicida, clama e grita,
Atroa aos Céus, e contra os Céus se irrita,
Nem mais a vida, que estimara, preza;
Arroja o arco, e à infeliz beleza
Consagra de seu corpo o último resto."

Vila Rica - Canto VII

"Ouve Garcia o canto, e não atina
De onde tanto prodígio, mas de Eulina
A delicada face está patente:
Fita os olhos, e vê desde a corrente
Lançar a mão à praia a Ninfa bela,
Toma uma areia de ouro, e já com ela
Pulveriza os cabelos: neste instante,
O sonho de Albuquerque o faz avante
Passar, os braços abre, a Ninfa chama;
Ela o vê, e não teme, e já se inflama
De amor por ele: aos braços o convida,
E abrindo o seio o rio, uma luzida
Urna de fino mármore os sepulta
Recebendo-os em si: ficou oculta
A maravilha a quantos o acompanham.
Em busca de Garcia já se entranham
Pelo matos mais densos; mas perdida
A esperança de achá-lo, e recolhida
Volta ao herói a esquadra aventureira."

Vila Rica - Canto VII

"Estamos, disse, em uns países novos,
Onde a polícia não tem ainda entrado,
Pode o rigor deixar desconcertado
O bom prelúdio desta grande empresa.
Convém que antes que os meios da aspereza
Se tente todo o esforço de brandura.
Não é destro cultor, o que procura
Decepar aquela árvore, que pode
Sanar, cortando um ramo, si lhe acode
Com sábia mão a reparar o dano;
Para se radicar do soberano
O conceito, que pede a autoridade,
Necessária se faz uma igualdade
De razão e discurso; quem duvida,
Que de um cego furor corre impelida
A fanática idéia desta gente?
Que a todos falta um condutor prudente
Que os dirija ao acerto?
Quem ignora
Que um monstruoso corpo se devora
A si mesmo, e converte em seu estrago
O que pensa e medita? Ao brando afago
Talvez venha ceder: e quando abuse
Da brandura, e obstinados se recuse
A render ao meu Rei toda a obediência,
Então porei em prática a violência;
Farei que as armas e o valor contestem
O bárbaro atentado; e que detestem
A preço do seu sangue a torpe idéia.
Disse; e deixando a todos a alma cheia
De uma nobre esperança, já passava
A saber de Garcia, nem lhe dava
Notícia dele algum dos três Pereiras."


sábado, 13 de junho de 2009

O Poema "Villa Rica"



Villa Rica é um poema épico escrito por Cláudio Manuel da Costa em 1773, narra em versos a história de fundação de Minas Gerais, que se dá com a viagem de Antônio Albuquerque Coelho de Carvalho às Minas Gerais, no início do século XVIII, resolvendo o conflito da Guerra dos Emboabas. O poema possui dez cantos e usa versos decassílabos com rimas emparelhadas.

O poema épico Vila Rica ficou pronto em 1773, mas foi publicado somente em 1839, em Ouro Preto. O respectivo “fundamento histórico” havia sido dado a lume pelo jornal O Patriota, do Rio de Janeiro, em 1813, sob o título de “Memória histórica e geográfica da descoberta das Minas”. É a descrição da epopéia dos bandeirantes paulistas no desbravamento dos sertões e suas lutas com os emboabas indígenas, até a fundação da cidade de Vila Rica.

O poema é importante porque, apesar de fiel aos cânones do Arcadismo, destaca-se pela temática brasileira, conferindo a Cláudio Manuel da Costa o título maior de fundar uma literatura que significasse a incorporação o Brasil à cultura do Ocidente.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Cláudio Manoel da Costa

Cláudio Manuel da Costa
Biografia
Cláudio Manuel da Costa nasceu em Vargem do Itacolomi, hoje Mariana, na então capitania de Minas Gerais, em 4 de junho de 1729 e faleceu em Vila Rica, em 4 de julho de 1789. Ele foi um jurista e poeta brasileiro da época colonial.
Filho de João Gonçalves da Costa, português, e Teresa Ribeira de Alvarenga, mineira, nasceu no sítio da Vargem do Itacolomi, freguesia da vila do Ribeirão do Carmo, atual cidade de Mariana em Minas Gerais.
Tornou-se conhecido principalmente pela sua obra poética e pelo seu envolvimento na Inconfidência Mineira. Contudo, foi também advogado de prestígio, fazendeiro abastado, cidadão ilustre, pensador de mente aberta e mecenas do Aleijadinho. Estudou cânones em Coimbra e há quem acredite que ele tenha traduzido a obra de Adam Smith para o português, mas isso nunca foi muito bem fundamentado.
Com vinte anos embarcou para Portugal, com destino a Coimbra, em cuja Universidade se formou em cânones. Entre 1753 e 1754, voltou ao Brasil, voltando-se à advocacia em Vila Rica (hoje Ouro Preto), jurista culto e renomado da época, ali exerceu o cargo de procurador da Coroa, desembargador, também exerceu por duas vezes o importante cargo de secretário do Governo. Por incumbência da Câmara de Ouro Preto elaborou "carta topográfica de Vila Rica e seu têrmo" em 1758.
Por sua idade, boa lição clássica, fama de doutor e crédito de autor publicado, exerceu Cláudio da Costa ali uma espécie de magistério entre os seus confrades em musa, maiores e menores, que todos lhe liam as suas obras e lhe escutavam os conselhos, era uma das figuras principais da Capitania.
Aos sessenta anos foi comprometido na chamada Conjuração Mineira. Preso e, para alguns, apavorado com as conseqüências da tremenda acusação de réu de inconfidência, morreu em circunstâncias obscuras, em Vila Rica, no dia 4 de julho de 1789, quando teria se suicidado na prisão.
Os registros da trajetória da vida de Cláudio revelam uma bem sucedida carreira no campo político, literário e profissional. Foi secretário de vários governadores, poeta admirado até em Portugal e advogado dos principais negociantes da capitania no seu tempo. Acumulou ampla fortuna e sua casa em Vila Rica, era uma das melhores vivendas da capital. Sólida e construção que ainda lá está a desafiar o tempo.
A memória de Cláudio Manuel da Costa, porém, não teve a mesma sorte. Até hoje paira sobre ele a suspeita de ter sido um miserável covarde que traiu os amigos e se suicidou na prisão. Outros negam até a própria relevância da sua participação na inconfidência mineira, pintando-o como um simples espectador privilegiado, amigo de Tomás Antônio Gonzaga e Alvarenga Peixoto, freqüentadores assíduos dos saraus que ele promovia.

Cláudio tentou, ele próprio, diminuir a relevância da sua participação na conspiração, mas estava apenas tentando reduzir o peso da sua culpa diante dos juizes da devassa. Os clássicos da historiografia da inconfidência mineira são unânimes em valorizar sua participação no movimento. Parece que ele era meio descrente com as chances militares da conspiração. Mas não deixou de influenciar no lado mais intelectualizado do movimento, especialmente no que diz respeito à construção do edifício jurídico projetado para a república que pretendiam implantar em Minas Gerais, no final do século XVIII.
De qualquer modo José Pedro Machado Coelho Torres, juiz nomeado para a Devassa de 1789 em Minas Gerais, dele diz o seguinte: "O dr. Cláudio Manoel da Costa era o sujeito em casa de quem se tratou de algumas coisas respeitantes à sublevação, uma das quais foi a respeito da bandeir e algumas determinações do modo de se reger a República: o sócio vigário da vila de S. José é quem declara nas perguntas formalmente"...(Anais da Biblioteca Nacional, 1º vol. pg. 384).
O ponto mais crítico da biografia do poeta inconfidente vem a ser a suspeita do seu suicídio. Sua morte está cercada de detalhes estranhos. Há mais de duzentos anos que o assunto suscita debates e há argumentos de peso tanto a favor como contra a tese do suicídio. Os partidários da crença de que Cláudio Manuel da Costa tenha se suicidado se baseiam no fato de que ele estava profundamente deprimido na véspera da sua morte.
Isso está estampado no seu próprio depoimento, registrado na Devassa. Além disso, seu padre confessor teria confirmando seu estado depressivo a um frade que trouxe o registro à luz. Os partidários da tese de que Cláudio tenha sido assassinado, contestam tanto a autenticidade do depoimento apensado aos autos da Devassa, quanto a honestidade do registro do frade.
Quem acredita na tese do assassinato se baseia em um argumento principal: o próprio laudo pericial que concluiu pelo suicídio. Pelo laudo, o indigitado poeta teria se enforcado usando os cadarços do calção, amarrados numa prateleira, contra a qual ele teria apertado o laço, forçando com um braço e um joelho. Muitos acreditam ser impossível alguém conseguir se enforcar em tais circunstâncias.
O historiador Ivo Porto de Menezes relata que ao organizar antigos documentos relativos à Igreja Matriz de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto, em 1957 ou 1958, encontrou no livro de assentos dos integrantes da Irmandade de São Miguel e Almas, a anotação da admissão de Cláudio Manuel e à margem a observação de que havia "sufragado com 30 missas" a alma do falecido, e "pago tudo pela fazenda real". De igual forma procedera a Irmandade de Santo Antônio, que lançou em seu livro: "falecido em julho de 1789. E feitos os sufrágios." Relembra que havia à época proibição de missas pelos suicidas.
Também Jarbas Sertório de Carvalho, em ensaio publicado na Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, defende com boa documentação a tese do assassinato.Há ainda quem acredite que o próprio governador, Visconde de Barbacena, esteve envolvido na conspiração e Cláudio teria sido eliminado por estar disposto a revelar isso. Mas o fato é que somente a tese do suicídio pôde se lastrear em documentos, ainda que duvidosos quanto a sua honestidade e veracidade, como bem salientam os adeptos da tese de assassinato.
Assim, a própria História continua pendente quanto às verdadeiras circunstâncias da morte de Cláudio Manuel da Costa e isso continua a ser o ponto mais marcante da sua biografia, não o bastante esta sua vida plena de passagens notáveis.
Dez dias depois da sua morte, a população de Paris tomava a fortaleza da Bastilha, marcando o início do fim da dinastia dos gloriosos Luíses de França. Começava a tomar corpo então, um projeto político, sonhado pelo próprio Cláudio Manuel da Costa para seu país. Demoraria, no entanto, mais trinta anos para que o Brasil se tornasse liberto de Portugal. Cem anos a mais seriam necessários para a realização da segunda parte do sonho, a implantação do regime republicano no Brasil.
É Patrono da Academia Brasileira de Letras. Glauceste Saturnino (ou Glauceste Satúrnio), pseudônimo do autor, faz parte da transição do Barroco para o Arcadismo. Seus sonetos herdaram a tradição de Camões.
Obras
Epicediu, consagrado à memória de fr. Gaspar da Encarnação - Coimbra, 1753.
Labirinto de amor, poema - Coimbra, 1753.
Númerosos harmônicos - Coimbra, 1753.
Obras Poéticas - Coimbra, 1768
Vila Rica, 1773
Soneto
Entre o Velho e o Novo Mundo
Poesias diversas - Revista Brazileira, Rio de Janeiro, 1895 (post.).
Minusculo métrico, romance heróico - Coimbra 1751.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Fragmento de "O Uraguay" - Canto Primeiro

Fumam ainda nas desertas praias
Lagos de sangue tépidos e impuros
Em que ondeiam cadáveres despidos,
Pasto de corvos. Dura inda nos vales
O rouco som da irada artilheria.
MUSA, honremos o Herói que o povo rude
Subjugou do Uraguai, e no seu sangue
Dos decretos reais lavou a afronta.
Ai tanto custas, ambição de império!
E Vós, por quem o Maranhão pendura
Rotas cadeias e grilhões pesados,
Herói e irmão de heróis, saudosa e triste
Se ao longe a vossa América vos lembra,
Protegei os meus versos. Possa entanto
Acostumar ao vôo as novas asas
Em que um dia vos leve. Desta sorte
Medrosa deixa o ninho a vez primeira
Águia, que depois foge à humilde terra
E vai ver de mais perto no ar vazio
O espaço azul, onde não chega o raio.
Já dos olhos o véu tinha rasgado
A enganada Madri, e ao Novo Mundo
Da vontade do Rei núncio severo
Aportava Catâneo: e ao grande Andrade
Avisa que tem prontos os socorros
E que em breve saía ao campo armado.
Não podia marchar por um deserto
O nosso General, sem que chegassem
As conduções, que há muito tempo espera.
Já por dilatadíssimos caminhos
Tinha mandado de remotas partes
Conduzir os petrechos para a guerra.
Mas entretanto cuidadoso e triste
Muitas cousas a um tempo revolvia
No inquieto agitado pensamento.
Quando pelos seus guardas conduzido
Um índio, com insígnias de correio,
Com cerimônia estranha lhe apresenta
Humilde as cartas, que primeiro toca
Levemente na boca e na cabeça.
Conhece a fiel mão e já descansa
O ilustre General, que viu, rasgando,
Que na cera encarnada impressa vinha
A águia real do generoso Almeida.
Diz-lhe que está vizinho e traz consigo,
Prontos para o caminho e para a guerra,
Os fogosos cavalos e os robustos
E tardos bois que hão de sofrer o jugo
No pesado exercício das carretas.
Não tem mais que esperar, e sem demora
Responde ao castelhano que partia,
E lhe determinou lugar e tempo
Para unir os socorros ao seu campo.
Juntos enfim, e um corpo do outro à vista,
Fez desfilar as tropas pelo plano,
Por que visse o espanhol em campo largo
A nobre gente e as armas que trazia.
Vão passando as esquadras: ele entanto
Tudo nota de parte e tudo observa
Encostado ao bastão. Ligeira e leve
Passou primeiro a guarda, que na guerra
É primeira a marchar, e que a seu cargo
Tem descobrir e segurar o campo.
Depois desta se segue a que descreve
E dá ao campo a ordem e a figura,
E transporta e edifica em um momento
O leve teto e as movediças casas,
E a praça e as ruas da cidade errante.
Atrás dos forçosíssimos cavalos
Quentes sonoros eixos vão gemendo
Co’ peso da funesta artilheria.
Vinha logo de guardas rodeado
- Fontes de crimes - militar tesouro,
Por quem deixa no rego o curvo arado
O lavrador, que não conhece a glória;
E vendendo a vil preço o sangue e a vida
Move, e nem sabe por que move, a guerra.

domingo, 7 de junho de 2009

O Uraguay

O Uraguai é um poema épico datado de 1769, o qual critica drasticamente os jesuítas, antigos mestres do autor. Ele alega que os jesuítas apenas defendiam os direitos dos índios para ser eles mesmos seus senhores. O enredo situa-se todo em torno dos eventos expedicionários e de um caso de amor e morte no reduto missioneiro.

Tema central: Pelo Tratado de Madri, celebrado entre os reis de Portugal e de Espanha, as terras ocupadas pelos jesuítas, no Uruguai, deveriam passar da Espanha a Portugal. Os portugueses ficariam com Sete Povos das Missões e os espanhóis, com a Colônia do Sacramento. Sete Povos das Missões era habitada por índios e dirigida por jesuítas, que organizaram a resistência à pretensão dos portugueses. O poema narra o que foi a luta pela posse da terra, travada em princípios de 1757, exaltando os feitos do General Gomes Freire de Andrade. Basílio da Gama dedica o poema ao irmão do Marquês de Pombal e combate os jesuítas abertamente.

PersonagensGeneral Gomes Freire de Andrade (chefe das tropas portuguesas); Catâneo (chefe das tropas espanholas); Cacambo (chefe indígena); Cepé (guerreiro índio); Balda (jesuíta administrador de Sete Povos das Missões); Caitutu (guerreiro indígena; irmão de Lindóia); Lindóia (esposa de Cacambo); Tanajura (indígena feiticeira).A pobreza temática impele Basílio da Gama a substituir o modelo camoniano de dez cantos por um poema épico de apenas cinco cantos, constituídos por versos brancos, ou seja, versos sem rimas.

Canto I: Saudação ao General Gomes Freire de Andrade. Chegada de Catâneo. Desfile das tropas. Andrade explica as razões da guerra. A primeira entrada dos portugueses enquanto esperam reforço espanhol. O poeta apresenta já o campo de batalha coberto de destroços e de cadáveres, principalmente de indígenas, e, voltando no tempo, apresenta um desfile do exército luso-espanhol, comandado por Gomes Freire de Andrade.

Canto II: Partida do exército luso-castelhano. Soltura dos índios prisioneiros. É relatado o encontro entre os caciques Cepê e Cacambo e o comandante português, Gomes Freire de Andrade, à margem do rio Uruguai. O acordo é impossível porque os jesuítas portugueses se negavam a aceitar a nacionalidade espanhola. Ocorre então o combate entre os índios e as tropas luso-espanholas. Os índios lutam valentemente, mas são vencidos pelas armas de fogo dos europeus. Cepé morre em combate. Cacambo comanda a retirada.

Canto III: O General acampa às margens de um rio. Do outro lado, Cacambo descansa e sonha com o espírito de Cepê. Este incita-o a incendiar o acampamento inimigo. Cacambo atravessa o rio e provoca o incêndio. Depois, regressa para a sede. Surge Lindóia. A mando de Balda, prendem Cacambo e matam-no envenenado. Balda é o vilão da história, que deseja tornar seu filho Baldeta, cacique, em lugar de Cacambo. Observa-se aqui uma forte crítica aos jesuítas. Tanajura propicia visões a Lindóia: a índia “vê” o terremoto de Lisboa, a reconstituição da cidade pelo Marquês de Pombal e a expulsão dos jesuítas.

Canto IV: Maquinações de Balda. Pretende entregar Lindóia e o comando dos indígenas a Baldeta, seu filho. O episódio mais importante: a morte de Lindóia. Ela, para não se entregar a outro homem, deixa-se picar por uma serpente. Os padres e os índios fogem da sede, não sem antes atear fogo em tudo. O exército entra no templo. Com a chegada das tropas de Gomes Freire, os índios se retiram após queimarem a aldeia.Canto V: Descrição do Templo. Perseguição aos índios. Prisão de Balda. O poeta dá por encerrada a tarefa e despede-se. Expressa suas opiniões a respeito dos jesuítas, colocando-os como responsáveis pelo massacre dos índios pelas tropas luso-espanholas. Eram opiniões que agradavam ao Marquês de Pombal, o todo-poderoso ministro de D. José I. Nesse mesmo canto ainda aparece a homenagem ao general Gomes Freire de Andrade que respeita e protege os índios sobreviventes.

O poema é escrito em decassílabos brancos, sem divisão em estrofes, mas é possível perceber a sua divisão em partes: proposição, invocação, dedicatória, narrativa e epílogo. Abandona a linguagem mitológica, mas ainda adota o maravilhoso, apoiado na mitologia indígena. Foge, assim, ao esquema tradicional, sugerido pelo modelo imposto em língua portuguesa, Os Lusíadas. Por todo o texto, perpassa o propósito de crítica aos jesuítas, que domina a elaboração do poema.
A oposição entre rusticidade e civilização, que anima o Arcadismo, não poderia deixar de favorecer, no Brasil, o advento do índio como tema literário. Assim, apesar da intenção ostensiva de fazer um panfleto anti-jesuítico para obter as graças de Pombal, a análise revela, todavia, que também outros intuitos animavam o poeta, notadamente descrever o conflito entre a ordenação racional da Europa e o primitivismo do índio.

sábado, 6 de junho de 2009

Basílio da Gama

Basílio da Gama (José Basílio da Gama), poeta, nasceu em São José do Rio das Mortes [depois São José del Rei, hoje Tiradentes], MG, em 22 de julho de 1740, e faleceu em Lisboa, Portugal, em 31 de julho de 1795. É o patrono da Cadeira nº 4 da Academia Brasileira de Letras, por escolha do fundador Aluísio Azevedo.
Era filho de Manuel da Costa Vilas-Boas, fazendeiro abastado, e de Quitéria Inácia da Gama. A morte do pai, ocorrida na sua primeira infância, acarretou situação difícil, valendo nesse transe um protetor, o brigadeiro Alpoim, que o encaminhou no Rio de Janeiro e facilitou os seus estudos no colégio dos jesuítas, onde faria o noviciado para professar na Companhia de Jesus. Com a expulsão dos jesuítas, em 1759, os que não eram professos podiam voltar à vida secular, pela qual optou Basílio da Gama, que prosseguiu seus estudos, provavelmente no Seminário São José. Viajou depois pela Itália e Portugal, de 1760 a 67. Em Roma, foi recebido na Arcádia Romana sob o nome de Termindo Sipílio, com a proteção dos jesuítas, que teriam emendado os versos acadêmicos do poeta principiante e sem nenhuma produção de vulto. Em começos de 67 estava no Rio de Janeiro e assistia, em 8 de fevereiro, ao lançamento ao mar da nau Serpente, de que faz menção no Uraguai (Canto terceiro), na Ode II e no Soneto VI. Em 30 de junho de 1768, estava de viagem para Lisboa, a bordo da nau Senhora da Penha de França, com o objetivo de matricular-se na Universidade de Coimbra. Lá chegando, foi preso e condenado ao degredo para Angola, como suspeito de ser partidário dos jesuítas. Do desterro a que estava sentenciado salvou-o o Epitalâmio que escreveu às núpcias de D. Maria Amália, filha de Pombal. Este simpatizou com o poeta, perdoou-o e, depois de lhe conceder carta de nobreza e fidalguia, deu-lhe o lugar de oficial da Secretaria do Reino. Basílio identificou-se, desde então, com a política pombalina. Para conciliar as graças de Pombal, compôs o Uraguai, publicado em 1769 na Régia Oficina Tipográfica, de Lisboa. A queda do protetor, em 1777, não lhe alterou a posição burocrática. Não aderiu à Viradeira nem se juntou ao grupo dos aduladores da véspera que, após a queda de Pombal, passaram a vilipendiá-lo. No fim da vida, foi admitido na Academia das Ciências de Lisboa e publicou o poema Quitúbia (1791) e, de permeio, traduções e alguns versos de circunstância.
Obras: “Epitalâmio às núpcias da Sra. D. Maria Amália” e Uraguai (1769); A declamação trágica (1772), poema dedicado às belas artes; Os Campos Elíseos (1776), Quitúbia, (1791); e outros poemas. As suas poesias conhecidas foram reunidas por José Veríssimo nas Obras poéticas de José Basílio da Gama, edição comemorativa do bicentenário do poeta.

domingo, 31 de maio de 2009

Santa Rita Durão

Fragmento de "O Caramuru"
Canto I
I
De um varão em mil casos agitado,
Que as praias discorrendo do Ocidente,
Descobriu o Recôncavo afamado
Da capital brasílica potente:
Do Filho do Trovão denominado,
Que o peito domar soube à fera gente;
O valor cantarei na adversa sorte,
Pois só conheço herói quem nela é forte.

II
Santo Esplendor, que do grão-Padre manas
Ao seio intacto de uma Virgem bela;
Se da enchente de luzes Soberanas
Tudo dispensas pela Mãe Donzela;
Rompendo as sombras de ilusões humanas,
Tu do grão caso! a pura luz revela
Faze que em ti comece, e em ti conclua
Esta grande Obra, que por fim foi tua.

III
E vós, Príncipe excelso, do Céu dado
Para base imortal do Luso Trono;
Vós, que do Áureo Brasil no Principado
Da Real sucessão sois alto abono:
Enquanto o Império tendes descansado
Sobre o seio da paz com doce sono,
Não queirais de dignar-vos no meu metro
De pôr os olhos, e admiti-lo ao cetro.

IV
Nele vereis Nações desconhecidas,
Que em meio dos Sertões a Fé não doma;
E que puderam ser-vos convertidas
Maior Império, que houve em Grécia, ou Roma:
Gentes vereis, e Terras escondidas,
Onde se um raio da verdade assoma,
Amansando-as, tereis na turba imensa
Outro Reino maior que a Europa extensa.

V
Devora-se a infeliz mísera Gente,
E sempre reduzida a menos terra,
Virá toda a extinguir-se infelizmente;
Sendo em campo menor maior a guerra.
Olhai, Senhor, com reflexão clemente
Para tantos Mortais, que a brenha encerra;
E que, livrando desse abismo fundo,
Vireis a ser Monarca de outro Mundo.

VI
Príncipe do Brasil, futuro dono,
À Mãe da Pátria, que administra o mando,
Ponde, excelso Senhor, aos pés do Trono
As desgraças do Povo miserando:
Para tanta esperança é o justo abono,
Vosso título, e nome, que invocando,
Chamará, como a outro o Egípcio Povo,
D. José Salvador de um Mundo novo.


José de Santa Rita Durão

Sua vida
Frei José de Santa Rita Durão nasceu em Cata-Pretanas (nas proximidades de Mariana), Minas Gerais. Seus estudos tiveram início com os jesuítas no Rio de Janeiro. Formou-se em Teologia pela Universidade de Coimbra e ingressou na Ordem de Santo Agostinho. Nesse período, por volta de 1759, fez uma pregação contra os padres da Companhia de Jesus pela expulsão dos jesuítas, mas depois se arrependeu durante a repressão do período pombalino, fugiu para a Itália, onde levou uma vida de estudos, durante mais de 20 anos.
Características do autor
A manifestação poética de Santa Rita Durão expressa o nativismo, estampado na exaltação da paisagem brasileira, dos seus recursos naturais, dos índios: seus costumes e suas tradições. Durão faz referências a fatos históricos, do século 16 até sua época. Apesar do retrocesso ao tipo de crônica informativa dos anos 1600, seu texto pertence à corrente literária do Arcadismo e valoriza a vida natural e simples, distante da corrupção.
Uma breve pincelada da corrente literária do Arcadismo no Brasil
O Arcadismo no Brasil teve início no ano de 1768, com a publicação do livro “Obras” de Cláudio Manuel da Costa.

Nesse período Portugal explorava suas colônias a fim de conseguir suprir seu déficit econômico. A economia brasileira estava voltada para a era do ouro, da mineração e, portanto, ao estado de Minas Gerais, campo de extração contínua de minérios. No entanto, os minérios começaram a ficar escassos e os impostos cobrados por Portugal aos colonos ficaram exorbitantes.
Surgiu, então, a necessidade do Brasil de buscar uma forma de se desvincular do seu explorador. Logo, os ideais revolucionários começaram a se desenvolver no Brasil, sob influências das Revoluções Industrial e Francesa, ocorridas na Europa, bem como do exemplo da independência das 13 colônias inglesas.
Enquanto na Europa surgia o trabalho assalariado, o Brasil ainda vivia o tempo de escravidão. Há um processo de revoltas no Brasil, contudo, a mais eloquente durante o período árcade é a Inconfidência Mineira, movimento que teve envolvimentos dos escritores árcades, como Tomás Antônio Gonzaga, Alvarenga Peixoto e Cláudio Manuel da Costa, além do dentista prático Tiradentes.

O Arcadismo no Brasil é diferente do europeu. Em primeiro lugar, usa a paisagem mineira como cenário bucólico, valoriza as coisas da terra, revelando um forte sentimento nativista. A presença do índio na poesia reflete o ideal do "bom selvagem iluminista", que não existe nos poemas europeus. Outra característica é a sátira política à opressão portuguesa e da corrupção colonial.
Os principais autores árcades são: Cláudio Manoel da Costa, Tomás Antonio Gonzaga, Basílio da Gama, Silva Alvarenga e Frei José de Santa Rita Durão.
Sua obra
"Viajou pela Espanha, Itália e França, voltou a Portugal na época da queda do Marquês de Pombal e a restauração da monarquia tradicional e foi quando se dedicou a escrever o seu grande poema épico "Caramuru", publicado em 1781. O qual tem como subtítulo “Poema épico do Descobrimento da Bahia”, escrito no padrão da poesia de Camões.
Conta-se que a obra teria sido recebida com indiferença e que isso fez Santa Rita Durão destruir várias poesias líricas suas.
Característica da obra
O poema épico Caramuru é publicado doze anos depois de O Uraguai, contudo não existe uma continuidade entre ambos. Nem formal, nem ideológica. Ao contrário de Basílio da Gama, admirador de Pombal, Santa Rita Durão lembra o período pombalino como uma época de horrores. Assim, a visão anti-jesuítica de seu antecessor cede lugar a uma narrativa de inspiração religiosa.

Também ao inverso de Basílio da Gama, que procurou inovar usando versos brancos e dividindo o poema em apenas cinco cantos, o bom Frei segue rigidamente o modelo camoniano de Os Lusíadas. Realiza seu poema em dez cantos, com estrofes de oito versos decassílabos e rimados.

"O Caramuru" faz um balanço da colonização em meio a uma descrição hiperbólica da natureza. Neste poema são exaltadas a fé e a defesa da terra contra os invasores. Segundo o crítico Antonio Candido, "A obra de Durão pode ser vista tanto como expressão do triunfo português na América quanto das posições particularistas dos americanos; e serviria, em princípio, seja para simbolizar a lusitanização do país, seja para acentuar o nativismo.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Fragmento de "Prosopopeia"


''LX
Olhai o grande gozo e doce glória
Que tereis quando, postos em descanso,
Contardes esta larga e triste história,
Junto do pátrio lar, seguro e manso.
Que vai da batalha a ter victória,
O que do Mar inchado a um remanso,
Isso então haverá de vosso estado
Aos males que tiverdes já passado.''


terça-feira, 26 de maio de 2009

Prosopopeia

Assim como sua biografia, são confusas as informações relativas as obras escritas por Bento Teixeira. Muitas foram lhe atribuídas. As principais são:

-Relações do naufrágio: De acordo com os estudos de Vernhagen, a obra é de autoria de Afonso Luís, piloto de uma nau chamada "Santo Antônio", citado em Prosopopéia.

-Diálogos das grandezas do Brasil: Segundo Capistrano de Abreu, a obra é de autoria de Ambrósio Fernandes Brandão.

Portanto, ao que tudo indica, Prosopopéia foi sua única obra.


Prosopopéia

Publicada em 1601, de grande valor histórico, a obra mais famosa do escritor é o poema épico, já citado, Prosopopéia. Nele, o escritor fala sobre a vida e o trabalho de Jorge de Albuquerque Coelho, terceiro donatário da Capitania de Pernambuco, e seu irmão, Duarte. É a única obra reconhecida e aceita como de sua autoria. Além disso, é a primeira obra com finalidade meramente literária publicada em solo brasileiro.

Escrito em oitava rima, com noventa e quatro estrofes, o poema marcou o início do movimento barroco no Brasil. Ao que parece, a obra foi influenciada pelo poema Os Lusíadas, de Camões. Tal influência é percebida quando analisada a sintaxe, e a estrutura. A sintaxe é extremamente clássica, cheia de inversões, o que dificulta o entendimento por um leitor do século XXI. A estrutura segue de perto a da obra de Camões, como se percebe já de inicio pela existência de proposição (Onde apresenta o assunto da epopéia: cantar os feitos de Jorge d'Albuquerque), invocação (quando pede ajuda do Deus cristão para compor seu texto) e dedicação (o texto é dedicado a Jorge d'Albuquerque, visando ajuda financeira).

De caráter heróico, a suposta coragem e valentia dos irmãos é narrada em decassílabos. Os acontecimentos abordados dizem respeito as terras brasileiras e a região de Alcácer-Quibir, na África, onde os irmãos teriam se destacado em uma importante batalha. Ambos, teriam também sofrido com um naufrágio, quando viajavam na nau Santo Antônio.

domingo, 24 de maio de 2009

Um pouco de Bento Teixeira

Bento Teixeira

(Porto, 1561 (?) - Pernambuco ou Lisboa, 1618 (?)) foi um poeta luso-brasileiro.
De biografia nebulosa, alguns o consideram brasileiro. No entanto, outra corrente o considera português. Há controvérsia também sobre o local de sua morte: alguns afirmam ser em Pernambuco; outros afirmam ser em Lisboa.

É considerado o primeiro poeta do Brasil. No entanto, essa afirmação vem sendo questionada por vários historiadores.Brasil. No entanto, essa afirmação vem sendo questionada por vários historiadores.

Apesar de ter vivido grande parte de sua vida no Brasil, Bento Teixeira nasceu na cidade do Porto. Era filho de Manuel Alvares de Barros e Lianor Rodrigues, ambos cristãos. Brasil, Bento Teixeira nasceu na cidade do Porto. Era filho de Manuel Alvares de Barros e Lianor Rodrigues, ambos cristãos.


Vida

Existem poucas e confusas informações sobre a vida de Bento Teixeira. Sabe-se que estudou no Colégio da Bahia e que frequentou um seminário no mesmo estado, após ter vindo, com sua família, de Portugal (1567 (?)). Ao revelar que era judeu, teve que fugir para o estado do Pernambuco.


Na região pernambucana, começou a trabalhar como professor de aritmética, gramática e língua latina. Casou-se com Filipa Raposa, em 1584 (?), na cidade baiana de Ilhéus.

Alegando adultério, Bento Teixeiro assassinou sua própria esposa. Tal fato, o obrigou a fugir novamente, refugiando-se no Mosteiro de São Bento, em Olinda. Isso foi possível devido ao seu direito de asilo, que vigorava até então. Lá, escreveu sua obra-prima: Prosopopéia.

Outra versão diz que Bento Teixeira foi acusado pela esposa de ser judeu. O poeta teria sido julgado e absolvido pelo ouvidor da Vara Eclesiástica da Inquisição, em 1589. Intimado posteriormente pelo visitador do Santo Ofício, acabou confessando ser seguidor da religião judia.

Irritado com a denúncia da esposa, a assassinou, se refugiando no mosteiro já citado. Localizado, foi preso e enviado para Lisboa, em 1595 (?), onde permaneceu até sua morte.



sexta-feira, 22 de maio de 2009

Poetas Épicos Brasileiros


Pouco mais de um século havia se passado desde que o Brasil fora descoberto. As poucas cidades existentes aqui nas terras brasileiras eram pequenas e, por estarem distantes umas das outras, o contato entre as mesmas era insignificante. Havia contato somente com a metrópole portuguesa.

Contudo, mesmo assim aqui nas terras do Novo Mundo começaram a surgir as primeiras manifestações literárias. Os primeiros poetas, naturalmente, seguiam os modelos europeus e, mais especificamente, os modelos portugueses. Esses poetas, é preciso reconhecer, enfrentavam enormes dificuldades para divulgar suas obras. Muitas vezes, mal alcançavam as demais cidades e vilas da colônia.

Bento Teixeira, autor de “A Prosopopéia”, viveu nos anos finais do século XVI e primeira metade do século XVII. Ele é considerado o primeiro poeta brasileiro. Alguns, por outro, afirmam que ele deve ser considerado um autor português.

Frei José de Santa Rita Durão era mineiro, tendo vivido no século XVIII. Sua obra mais conhecida é o “Caramuru”. A obra é um verdadeiro tributo à sua terra natal.

Basílio da Gama, outro mineiro, viveu na segunda metade do século XVIII. Ele escreveu vários poemas, sendo o mais famoso “O Uraguay”, escrito em 1769.

Finalmente, Cláudio Manoel da Costa, mineiro – naturalmente – foi jurista e poeta luso-brasileiro dos tempos coloniais. Sua obra de maior destaque é “Villa Rica”, de 1773.
Para fechar com chave de ouro, uma raridade de valor inestimável: Teresa Margarida da Silva e Orta, uma escritora luso-brasileira do século XVIII cuja obra começou a ser reconhecida somente a partir do século XX.